Durante a
gestão da ministra Ideli Salvatti, o Ministério da Pesca liberou de uma só vez
R$ 769,9 mil para a organização não governamental (ONG) de um funcionário
comissionado do governo de Agnelo Queiroz (PT-DF) implantar um projeto de
criação de peixes no entorno de Brasília que não saiu do papel.
Trata-se
do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Integral da Natureza - Pró-Natureza,
do diretor da Codeplan Salviano Antônio Guimarães Borges. Segundo a
justificativa do projeto enviada ao ministério, o Distrito Federal, mesmo sem
haver estatísticas oficiais sobre o tema, tem grande consumo e produção de
peixes. Só que 11 meses depois, nenhum viveiro foi instalado. Oficialmente, o
projeto da ONG terminou ontem.
No Núcleo
Rural Rajadinha, em Planaltina (DF), a 40 quilômetros da sede do ministério,
mandiocas crescem no lugar dos tanques de tilápias.
“O
pessoal veio aqui uma vez no ano passado e ofereceu o projeto. Nós aceitamos e
eles não apareceram mais. Achei que tinham desistido, mas têm 15 dias que
voltaram e falaram que os tanques vão ficar prontos em julho. Parece que só
agora o projeto foi aprovado e eles vão receber o dinheiro”, relata o
agricultor Joami de Souza Ramos.
O
agricultor diz que nunca criou peixes, tampouco participou de cursos ou
qualquer atividade do projeto. Na chácara ao lado, incluída no rol de
beneficiários do ministério, também não há sinal de tanques.
Outros
moradores do núcleo rural confirmam que nunca participaram de capacitações. O
único viveiro no local é o de um sítio que está à venda e foi construído pelo
próprio morador. O agricultor ainda aguarda os peixes do projeto para começar a
criação.
Documentos
apresentados pela ONG ao ministério e obtidos pelo Grupo Estado mostram que,
antes mesmo de receber qualquer recurso, a entidade pagou R$ 75,9 mil para a
Rover Consultoria Empresarial Ltda. elaborar um diagnóstico sobre a pesca no
entorno. A nota fiscal foi emitida em nome de Gabriel Miranda Pontes Rogério,
um chef de cozinha.
Sem
nenhum tanque pronto ou cursos ofertados, a Pró-Natureza solicitou em 28 de
outubro do ano passado ao ministro Luiz Sérgio (PT-RJ) um aditivo de 16 meses e
mais R$ 224,7 mil.
Segundo o
ofício, os extras seriam para aprovação de novo cronograma. Pela proposta,
entre dezembro e fevereiro de 2012 seriam oferecidos os cursos de capacitação e
a obtenção das licença e outorgas para a construção dos viveiros; abril a
julho, período de construção e lançamento de edital para aquisição de material;
agosto e setembro, primeiro ciclo de criação de peixes, e janeiro de fevereiro
de 2013, término do primeiro ciclo dos peixes.
Em 22 de
março deste ano, a ONG encaminhou novo ofício cobrando o aditivo
financeiro,agora do ministro Marcelo Crivella (PRB-RJ). No mesmo dia, o
superintendente da Pesca no DF, o militante petista Divino Lúcio da Silva,
pediu atenção especial ao projeto. O ministério chegou a alterar o nome do
fiscal do contrato, obrigatório nos convênios, para que o controle ficasse sob
a responsabilidade de Divino.
Segundo a
ONG, o projeto teria sido elaborado por Divino, indicado ao cargo pelo PT-DF, e
outros representantes do Colegiado Territorial das Águas Emendadas (Cotae). O
grupo teria procurado a Fetraf, que levou o projeto à entidade, que por fim o
apresentou ao ministério.
Em nota,
o Ministério da Pesca informou que foram concluídas a realização do
diagnóstico, a seleção das famílias, a obtenção das outorgas de água e o curso
de tecnologia, além de parte do licenciamento ambiental e a impressão do
material didático. Afirma que não há impedimento de o superintendente ser o
fiscal do projeto. “Trata-se de um projeto com alcance social para o público de
assentamento e agricultores familiares do Território da Cidadania das Águas
Emendadas, composta por 11 municípios dos Estados de MG, GO e DF”, alega o
ministério.
Justificativa
Por meio
de sua assessoria, Ideli afirmou que o convênio com a ONG não foi firmado
durante sua gestão. A execução e a liberação dos recursos foram feitas pela
ministra em cumprimento ao cargo que ocupava. “Uma vez que não havia qualquer
suspeição, a ministra não poderia se negar a pagar o convênio, correndo o risco
de responder por não cumprir os compromissos firmados na gestão anterior”, diz
sua assessoria.
A
reportagem tentou falar com Salviano, porém ele não respondeu. Um e-mail também
foi encaminhado à ONG com perguntas sobre o convênio. Também não houve
resposta.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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